Saiba como agir juridicamente em caso de atraso, cancelamento, overbooking e extravio de bagagem, com base na legislação brasileira e em normas internacionais.
Introdução
Quem nunca passou por uma turbulência fora do avião? Atrasos inexplicáveis, voos cancelados de última hora, bagagens extraviadas e a clássica espera sem resposta no balcão da companhia aérea. Situações como essas são mais comuns do que deveriam — e, o mais preocupante, é que muitos passageiros ainda não sabem que têm direitos assegurados por lei para lidar com esses contratempos.
O transporte aéreo, embora regido por normas específicas e por uma estrutura regulatória sólida, como a da Agência Nacional de Aviação Civil (ANAC), ainda apresenta desequilíbrios na relação entre empresas e consumidores. Diante disso, é essencial que o passageiro saiba: você não está à mercê da sorte. Existem garantias legais, compensações financeiras e medidas práticas à sua disposição.
Neste artigo, apresentamos um guia objetivo e fundamentado sobre os principais direitos dos passageiros aéreos — do embarque ao desembarque — e como reivindicá-los de forma eficaz, inclusive com apoio judicial, quando necessário.

Direito à Informação
O direito à informação é o primeiro e mais fundamental dos direitos do passageiro. Ele garante que o consumidor saiba exatamente o que está contratando, o que pode esperar do serviço e como agir em situações imprevistas.
As companhias aéreas são obrigadas a fornecer, de forma clara e acessível:
- Horários e condições dos voos;
- Regras de reembolso e remarcação;
- Políticas de bagagem;
- Atualizações sobre atrasos, cancelamentos e mudanças de portão de embarque.
A Resolução n.º 400/2016 da ANAC disciplina esse direito, determinando que o passageiro seja informado imediatamente sobre qualquer alteração programada no voo e receba explicações adequadas e documentadas em caso de atraso ou cancelamento.
O descumprimento desse dever de transparência configura infração ao Código de Defesa do Consumidor (CDC), sobretudo aos princípios da boa-fé objetiva e do dever de informação (arts. 4º e 6º, III, do CDC), podendo gerar o direito à reparação por danos materiais e morais.
Assistência Material
Quando há atraso, cancelamento de voo ou preterição de embarque (como no overbooking), a companhia aérea tem o dever de prestar assistência material ao passageiro, independentemente do motivo do problema.
A Resolução n.º 400/2016 da ANAC estabelece que essa assistência deve ser progressiva, conforme o tempo de espera:
- A partir de 1 hora – acesso à comunicação (internet, ligações etc.);
- A partir de 2 horas – alimentação adequada (voucher, refeição ou lanche);
- A partir de 4 horas – hospedagem e traslado, se necessário.
Esse direito independe de culpa da companhia — trata-se de um dever objetivo, vinculado à dignidade do passageiro e ao dever de minimizar os transtornos.
Omissão ou assistência inadequada (ex.: voucher insuficiente, hotel sem vagas) pode ser documentada por fotos, vídeos ou registros de atendimento e resultar em indenização por danos materiais e morais, com base no art. 14 do CDC.

Reembolso e Reacomodação
Em caso de atrasos superiores a quatro horas, cancelamentos ou preterição de embarque, o passageiro tem direito de escolher entre três alternativas, conforme a Resolução n.º 400/2016 da ANAC:
- Reembolso integral do valor pago, incluindo tarifas, taxas e encargos;
- Reacomodação em outro voo da mesma companhia ou de terceiros, sem custo adicional;
- Remarcação da viagem para data e horário de sua conveniência.
A escolha cabe ao passageiro — não pode ser imposta pela companhia. Forçar a aceitação de vouchers ou remarcações sem consentimento configura prática abusiva (art. 39 do CDC).
O reembolso deve ser feito em até 7 dias corridos, contados da solicitação formal, e na mesma forma de pagamento utilizada (art. 29 da Resolução nº 400/2016).
Overbooking (Preterição de Embarque)
O overbooking ocorre quando a companhia vende mais passagens do que os assentos disponíveis — prática que, embora legal, exige compensação imediata.
O passageiro tem direito a:
- Assistência material, conforme o tempo de espera;
- Escolha entre reembolso, reacomodação ou remarcação;
- Compensação financeira imediata, conforme o art. 28 da Resolução nº 400/2016.
O valor mínimo é de R$ 1.000,00 (voos nacionais) e R$ 1.300,00 (voos internacionais) — salvo atualização. A compensação pode ser feita via transferência, voucher ou crédito.
Importante: se o passageiro for retirado contra sua vontade, pode ainda ajuizar ação judicial por danos morais. Já quando há voluntários para ceder o assento, a negociação é livre.
Extravio, Danos ou Atraso na Bagagem
A companhia aérea é objetivamente responsável por qualquer problema com a bagagem despachada, conforme art. 14 do CDC, independentemente de culpa.
Procedimentos
- Procure o balcão da companhia imediatamente após constatar o problema e preencha o RIB (Registro de Irregularidade de Bagagem);
- A bagagem é considerada extraviada após 7 dias (voos nacionais) ou 21 dias (internacionais) sem entrega;
- A empresa deve indenizar despesas emergenciais durante esse período.

Indenizações
Havendo extravio, o passageiro tem direito à indenização por danos materiais e morais. Se houver dano físico à mala, a companhia deve reparar, substituir ou indenizar.
O prazo judicial para ação é de até 5 anos (art. 27 do CDC), mas recomenda-se formalizar a reclamação imediatamente e guardar comprovantes.
Direitos em Voos Internacionais
Além das normas brasileiras, aplicam-se aos voos internacionais:
- Regulamento Europeu (CE) n.º 261/2004 – Aplica-se a voos com origem na UE ou operados por companhias europeias, com destino à UE. Garante:
- Convenção de Montreal – Ratificada pelo Brasil, regula:
Há tetos de indenização em Direitos Especiais de Saque (DES), mas o passageiro pode pleitear danos morais com base na legislação brasileira.
Conclusão
Viajar de avião envolve não apenas expectativas, mas também riscos que, muitas vezes, escapam ao controle do passageiro. Cancelamentos, atrasos, extravios e abusos contratuais ainda fazem parte da realidade do transporte aéreo.
Conhecer os direitos previstos na legislação brasileira — especialmente na Resolução ANAC n.º 400/2016 e no CDC — é essencial para exigir respeito, assistência e reparação.
Mais do que saber que esses direitos existem, é preciso saber como e quando exercê-los:
- Guardar comprovantes;
- Registrar atendimentos;
- Utilizar canais formais de reclamação;
- E, se necessário, buscar o Judiciário.
Companhias aéreas devem ser responsabilizadas não apenas por falhas, mas também pela negligência no dever de informar, atender e reparar.
O passageiro bem informado não apenas viaja com mais tranquilidade, mas também contribui para um transporte aéreo mais justo, eficiente e equilibrado.